segunda-feira, 12 de julho de 2010

Pensando a Morte


A morte, tão falada e velada ao mesmo tempo. Uma questão importante da nossa sociedade que não sabe lidar com um a única certeza da vida.
Vivemos em um mundo cada vez mais arrogante e narcisista, ou seja, pessoas individualistas em seus sentimentos, atitudes e escolhas, levando em conta somente aquilo que lhe possa promover prazer e justamente aquilo que lhe possa prolongar a sensação de prazer. Somos escravos da pulsão, seja pela comida, pelas paixões, pelo sexo, pela suposta e prejulgada beleza física, pela falta e decadência dos relacionamentos afetivos, entre outras. Em contra ponto a essas atitudes individualistas, também somos reféns do coletivo, afinal, vivemos e fazemos parte de redes sociais perfeitamente interligadas. O que eu faço ou falo, interfere diretamente na vida do outro, pois constrói ou reforça toda uma maneira de pensar e agir. Somos extremamente solitários vivendo em teias onde todos estão inseridos.
Somos capazes de fazer escolhas independentes das opiniões e desejos dos outros? Somos capazes de escolher o que estudar, em qual área queremos trabalhar, se vamos nos casar ou não, se queremos filhos ou não. Mas será mesmo que fazemos todas essas escolhas?
Segundo alguns autores que lidam com a questão da relação de poder e alienação, não fazemos essas escolhas de forma consciente, apenas nos deixamos levar pelo fluxo social. Somos covardes o suficiente para não fazermos uma viagem interna e podermos refletir sobre nossa própria condição humana. A sombra dói, e a morte, é parte desse processo natural.
A morte choca, pois, em primeiro instante não é nossa, é dos outros, ou seja, a relação que mantemos com a morte é de afastamento. Hoje em dia não se morre mais em casa, pois a morte tornou-se parte integral da medicina. É dizer, levamos nossos familiares e amigos para morrer no hospital, logo, os velamos em locais que não tem sequer alguma referência e respeito com sua trajetória e experiência de vida, são locais próprios para o morto ser posto e, logo, não muito longe dessa sala com o clima pesado que a morte se apresenta, os mesmos são enterrados ou cremados.
Sim, a morte dói, e dói tanto porque promove uma reflexão interna, ou um choque interno. Mas é algo que não estamos “acostumados” e preparados para suportar, logo o desejo predominante é de afastamento, de negação e de banimento da morte.
Para algumas sociedades antigas, a morte estava profundamente ligada à vida. Nos tempos dos pagãos era uma ideia aceita, ou seja, a morte tinha o seu lugar. Aquele morre, volta para a natureza de sua maneira mais pura, completa um ciclo único de vida-morte. Geralmente o cadáver era deixado longe de aldeias para que os animais comessem, visto que essa pessoa quando viva também se alimentou de animais. Toda a matéria é finita.
  Com o aparecimento da idade da razão, o homem se vê capaz de controlar a natureza e os fenômenos humanos, foi o grande momento de explosão científica e claramente tudo foi sendo dicotomizado, ou seja, corpo e alma, natural e sobrenatural, homem e deus, e a mais chocante de todas as dualidades: a vida e a morte. É justamente nesse momento da modernidade em que começamos a nos afastar da morte.
Segundo Pascal e Foucauld, o homem não tem capacidade de enfrentar a extinção, bem como sua própria vida, e é justamente essa falta de condições de aceitar a sua própria condição mortal (por que sim, somos todos mortais!), que o homem lança mão dos mais diversos subterfúgios com a finalidade de esquecer sua própria existência, ou ainda dar um ilusório sentido à mesma.
   Medo é a palavra chave. Sim, medo da morte repentina, medo do assassinato, medo do desejo do suicídio, do direito da escolha da morte tão praticado na antiguidade greco-romana em que não havia essa separação dualística. Do paganismo, fomos ao cristianismo. Da consciência da morte, fomos ao culto à vida.
É nesse momento da história em que a sacralidade da vida passa a ser uma verdade, é referenciada como um don divino e tem de ser preservada a todo custo. Uma mudança radical da forma de pensamento, uma mudança de pólos.
O homem ocidental aos poucos foi expulsando a morte do seu cotidiano e passou a considerá-la como um fato excepcional, frio, reprimido e proibido. A religião cristã então foi celebrando a vida e deixando a morte para os mortos, ou seja, foi significando a morte como uma passagem para a grande e verdadeira vida certa e absoluta para todos, então, vivamos a vida e deixamos a morte para o futuro.
E nós, homens e mulheres contemporâneos, como vemos a morte?
Segundo Scarlett Marton, hoje em dia, encaramos a morte como uma situação paradoxal, sendo que de um lado está a banalização da morte, ou seja, fala-se da morte o tempo todo, e ela aparece para nós como algo corriqueiro, além de ser citada como fenômeno biológico e social, através de índices e padrões estabelecidos por várias áreas da ciência. Cabe então perguntar-se porque a morte é sempre vista como uma espécie de escândalo, horror e curiosidade? Porque de um lado está a banalização da morte, mas por outro lado, está o caráter desconcertante e vertiginoso da morte. É um fato que não se assemelha a nenhum outro fato.
E para você, a morte é tão extraordinária? Tão dura? Tão persistente em sua dor?
Vale a pena refletir sobre a relação que mantemos com a morte, afinal, ela já está acontecendo na sua vida, minuto a minuto.
    

Texto e Foto: Daniel Paiva.

3 comentários:

  1. Muito interessante o texto. Nunca havia pensado na morte dessa forma, nem com essas características históricas que nos fez pensar na morte como pensamos hoje.
    Parabéns!

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  2. Estou encantada com os textos e os pontos de reflexão,vc está notwitter tbm ou no facebook?
    São as redes sociais que mais uso e são práticas praler e divulgar.
    A morte nada mais certo do que considerar como princípio de estar vivo e única certeza. A dor maior é para os que ficam, é a dor do desapego.

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  3. nossa, obrigado. uso twitter e facebook sim... @dampaiva

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